Resumo Transplante de Menina

Por Nilbberth Silva



Tatiana escreveu uma centena de livros infantis. Mas esse é especial porque é autobiográfico. Ela conta sua mudança da Rua dos Navios, em Riga, na Letônia, para a rua Jaguaribe, em São Paulo.  Todo mundo lá em casa se emocionou com a descrição das brincadeiras que ela fazia com seu irmãozinho (“ele me ensinou metade do que sei sobre crianças”, diria Tatiana mais tarde), com o dia em que ela retirou as amídalas antes de embarcar (que operação aterrorizante!) e com a surpresa que a mocinha russa de dez anos teve quando chegou ao porto de Santos, no estado de São Paulo, e viu um enorme cacho de bananas.
Naquela época, banana era artigo caro na Letônia. A família só a comia em ocasiões especiais e havia um ritual para isso. O pai de Tatiana partia a fruta ao meio, diante de olhares reverentes. Cada filho comia lentamente seu pedaço, que era pra durar mais. Por isso, quando a menina viu o enorme ramo cheio de bananas no Brasil, achou que tivesse chegado ao País da Cocagna, da fartura sem fim.
Tatiana Belinky também sofreu o choque cultural. O livro conta que ela teve que defender o irmãozinho de brincadeiras cruéis e lidar com o estranhamento na escola. Mas ela sentia dores e via belezas em coisas diferentes das quais os adultos esperariam. Esse livro ensina que poesia é olhar o mundo de um jeito diferente – acho que com mais carinho – e que as crianças estão cheias disso. Por essa lição e por aquelas páginas de poesia, eu e minha família agradecemos muito.

Aqui tem um trecho de Transplante de menina:
“E foi nessa avenida Rio Branco que tivemos a nossa primeira impressão – e que impressão! – do carnaval brasileiro. Eu já tinha ouvido falar em carnaval: na Europa, era famoso o carnaval de Nice, na França, com a sua decantada batalha de flores; e o carnaval de Veneza, mais exuberante, tradicional, com gente fantasiada e mascarada dançando e cantando nas ruas. E havia também os luxuosos, e acho que “comportados”, bailes de máscaras, em muitas capitais européias. Eu já ouvira falar em fasching, carnevale, Mardi Gras – vagamente. Mas o que eu vi, o que nós vimos, no Rio de janeiro, não se parecia com nada que eu pudesse sequer imaginar nos meus sonhos mais desvairados.
Aquelas multidões enchendo toda a avenida, aquele “corso” – o desfile interminável e lento de carros, pára-choque com pára-choque, capotas arriadas, apinhados de gente fantasiada e animadíssima. Todo aquele mundaréu de homens, mulheres, crianças, de todos os tipos, de todas as cores, de todos os trajes – todos dançando e cantando, pulando, saracoteando, jogando confetes e serpentinas que chegavam literalmente a entupir a rua e se enroscar nas rodas dos carros… E os lança-perfumes, que que é isso, minha gente! E os “cordões”, os “ranchos”, os “blocos de sujos” – e todo o mundo se comunicando, como se fossem velhos conhecidos, se tocando, brincando, flertando – era assim que se chamavam os namoricas fortuitos, a paquera da época -, tudo numa liberdade e descontração incríveis, especialmente para aqueles tempos tão recatados e comportados…  (…)
E pensar que a gente não compreendia nem metade do que estava acontecendo! Todo aquele alarido, todas aquelas luzes, toda aquela agitação, toda aquela alegria desenfreada – tudo isso nos deixou literalmente embriagados e tontos de impressões e sensações, tão novas e tão fortes que nunca mais esqueci aqueles dias delirantes. Vi muitos carnavais depois daquele, participei mesmo de vários, e curti-os muito. Mas nada, nunca mais, se comparou com aquele primeiro carnaval no Rio de Janeiro, um banho de Brasil, inesquecível…”

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